top of page
Buscar

Tireoide: mudou tudo!


O tratamento dos principais problemas nessa glândula - câncer, hipertireoidismo e hipotireoidismo - foi revisto. Saiba como preservar a saúde da tireoide Nada nem ninguém gerou tanto bafafá no último Congresso Brasileiro de Endocrinologia e Metabologia, recém-ocorrido na Costa do Sauípe, na Bahia, quanto a tireoide. A glândula localizada no pescoço e que regula o ritmo de funcionamento de todo o organismo foi o tema central de 12 mesas-redondas, conferências e aulas – a título de comparação, a obesidade, outra estrela do evento científico, esteve presente em 11 palestras. Dá pra entender o porquê: novos estudos estão mudando pra valer a maneira como os médicos (e os pacientes) devem encarar e remediar os descompassos tireoidianos. A primeira grande notícia é a reclassificação de um tipo de câncer relativamente comum na glândula. Seu nome é complicado: variante folicular do carcinoma papilífero não invasivo encapsulado (ou EFVPTC, na sigla em inglês). Há seis meses, ele era considerado maligno e exigia um contra-ataque pesado, com cirurgia e boas doses de radiação.

Pois um convênio de cientistas do mundo inteiro capitaneado pela Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, decidiu alterar radicalmente o caráter desse tumor. “Partimos da observação de que, na maioria dos casos, ele evoluía muito bem, sem sinal de proliferação, mesmo quando não se faziam intervenções”, relata o patologista Venancio Alves, da Universidade de São Paulo e do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP), único brasileiro a fazer parte da investigação. Por isso, a partir deste ano, o que era um câncer passa a ser visto como nódulo benigno, que não carece necessariamente de bisturi ou bombardeios de iodoterapia. “Alguns colegas dizem que este foi o primeiro recall da história da medicina”, brinca a endocrinologista Patrícia Teixeira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Estima-se que o EFVPTC represente 20% do total de tumores de tireoide. A expectativa é que essa decisão reduza gastos com a saúde e o uso de tratamentos supérfluos, além de minimizar a ansiedade das pessoas diagnosticadas. A reclassificação é apenas um exemplo de uma série de transformações pelas quais a abordagem dos nódulos tireoidianos está passando. Todas as etapas de diagnóstico e tratamento são revistas atualmente e geram acalorados debates. Isso começou quando os experts perceberam que, nos últimos 25 anos, houve um aumento de três vezes no número de episódios, embora a taxa de mortalidade continuasse a mesma. A principal explicação para o fenômeno está na prescrição indiscriminada do ultrassom de pescoço, que vasculha a glândula à caça de tumores. A tecnologia progrediu tanto que essas máquinas são capazes hoje de apontar massas cada vez menores e indolentes. “Exames realizados com sujeitos de mais de 50 anos detectam lesões incidentais, sem grande significado para a saúde, em quase 60% das circunstâncias“, calcula o endocrinologista Hans Graf, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). E 100% daqueles que alcançaram as oito décadas de vida apresentam um caroço na região. Ou seja: flagrar um nódulo com características perigosas é um tanto quanto mais raro. Portanto, não se recomenda fazer o ultrassom de rotina, como acontece com a mamografia na prevenção do câncer de mama após os 45 anos. “Esse teste só está indicado como checkup quando há histórico familiar da doença ou suspeitas na palpação do pescoço no consultório”, afirma Graf. Aliás, 7% das malformações são perceptíveis no exame clínico, em que o médico palpa o pescoço do paciente Se alguma bolota esquisita é encontrada no ultrassom, a próxima fase envolve determinar se ela é tranquila ou agressiva. Isso é possível por meio da biópsia, em que uma agulha fina é inserida na região da garganta e aspira um pedacinho defeituoso da glândula para análise em laboratório. E não é que esse procedimento também é alvo de reformas? A Associação Americana de Tireoide – que admite uma certa epidemia artificial do problema – atualizou suas diretrizes sobre o assunto e aconselha que nódulos com menos de 1 centímetro não sejam avaliados por uma punção. Isso vale até para aqueles que aparentam ser do mal: basta monitorar seu crescimento de tempos em tempos. Essa conduta, por enquanto, ainda não é a realidade nas clínicas e nos hospitais brasileiros. Nada de precipitações com o câncer Mas, ok, vamos supor que o médico pediu ultrassom e biópsia e os laudos mostram que se trata de um tumor maligno. Pois senta que lá vem novidade: há situações em que o melhor é nem intervir. Estudiosos do Hospital Kuma, no Japão, seguiram 340 pessoas com microcarcinoma papilífero – o câncer de tireoide mais prevalente – durante dez anos, sem recorrer a qualquer ação. Nesse período, 15% tiveram uma ampliação da massa cancerosa superior a 3 milímetros e apenas 3% sofreram metástase, ou seja, as células malignas se espalharam por outras áreas. A lição nipônica é que, na maior parte das vezes, o indivíduo morre com o nódulo, mas não em decorrência dele. Essa é a típica ocasião em que a terapia se torna mais prejudicial do que a enfermidade em si. Isso abre a perspectiva de se tomar alguma atitude só no momento em que existe uma ameaça à saúde. “O tema é bastante controverso e o nosso desafio está em selecionar os casos em que uma operação não é mesmo necessária”, raciocina o cirurgião de cabeça e pescoço Erivelto Volpi, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Que fique claro: uma estratégia dessas é válida somente se o tumor é pequeno, não está num local complicado nem tem capacidade de se dispersar pela circulação ou sistema linfático. Aliás, uma discussão similar vem ocorrendo com o câncer de próstata. A própria cirurgia, aliás, já não é a mesma. Os cortes ganharam precisão, e as cicatrizes estão quase imperceptíveis. Os riscos se mostram modestos e, mais importante, a palavra de ordem é preservar sempre que possível. “Hoje em dia, dá para retirar metade da glândula e conservar a porção saudável”, conta o médico Antonio Bertelli, do Hospital Samaritano de São Paulo. A parcela sadia consegue até produzir o T3 e o T4 normalmente, sem precisar de reposição hormonal por meio de comprimidos diários.

Cinco fatores influenciam a probabilidade de os tumores aparecerem: Sexo: mulheres são mais propensas a desenvolver os carocinhos do que homens. A culpa é do estrogênio, hormônio feminino que estimula a proliferação desenfreada de células da tireoide. Idade: levantamentos comprovam que praticamente todas as pessoas com 80 anos têm massas tumorais na glândula. Na esmagadora maioria das vezes, isso não compromete o bem-estar delas. Genética: falhas no DNA predispõem a nódulos e tumores agressivos. Já está disponível um teste genético que antevê a doença e permite remover a glândula antes de o mal se instalar. Agressões: as versões autoimunes de hipotireoidismo e hipertireoidismo são marcadas por ataques das células de defesa ao tecido tireoidiano. Em longo prazo, isso também promove o surgimento de nódulos. Escassez de iodo: ele é o ingrediente básico da receita de T3 e T4. Se está em falta, tudo entra em parafuso. No Brasil, a carência é incomum, uma vez que o sal de cozinha é suplementado com esse mineral. Hiper e hipotireoidismo O hipotireoidismo, quando a glândula produz pouco hormônio e deixa o organismo lento, e o hipertireoidismo, situação contrária em que o corpo fica acelerado demais, são bem conhecidos e estudados. Mas, durante o congresso, causaram barulho as descobertas recentes sobre as versões subclínicas das duas doenças – o termo “subclínico” faz referência a um problema orgânico inicial que ainda tem poucas manifestações evidentes.

  • 8% dos brasileiros sofrem com o hipotireoidismo

  • 1,2% tem hipertireoidismo

  • 50% deles não sabem que têm disfunções tireoidianas. Um exame de sangue já flagra as variações.

Nessa situação, o hormônio TSH, liberado no cérebro e o grande influenciador do trabalho da tireoide, está em excesso (no hipotireoidismo) ou em falta (no hiper), só que o hormônio tireoidiano em si, o T4, está dentro dos níveis normais. Médicos ao redor do globo começaram a suspeitar que essa metamorfose prematura não é tão inofensiva assim. Desde então, pipocam pesquisas acusando um elo direto entre essas variações sutis e uma coleção de complicações.

  • 10% da população apresenta hipotireoidismo subclínico. A maioria nem sabe disso

  • 1,5% convive com o oposto: o hipertireoidismo subclínico

  • 15% daqueles com hipotireoidismo subclínico evoluem para a doença em si dentro de um ano.

O primeiro grupo do mundo a publicar achados sobre o hipertireoidismo subclínico é do Brasil, mais precisamente do interior paulista. O endocrinologista José Augusto Sgarbi, da Faculdade de Medicina de Marília, identificou que pessoas acompanhadas nesse estágio já sofriam perrengues cardiovasculares em comparação com quem tinha o TSH dentro das metas. “Observamos uma alteração na frequência das batidas do coração delas”, destaca Sgarbi. E o drama é que, entre essa turma, também foi registrado um maior número de infartos. Evidências posteriores, obtidas a partir de uma aliança internacional de pesquisadores, a Thyroid Studies Collaboration, reuniram dados de 55 mil pessoas de diversas etnias e desvendaram uma relação das quedas de TSH com osteoporose e AVCs. Tudo leva a crer que o hipotireoidismo subclínico também semeia desordem em várias instâncias… a começar pelos vasos sanguíneos. “Ele aumenta as taxas de colesterol ruim, o LDL, o que eleva o risco de doenças cardiovasculares”, exemplifica o endocrinologista Cleo Otaviano Mesa Junior, do Hospital de Clínicas da UFPR. Já existem indícios, ainda, de que o hipo leve teria algo a ver com infertilidade e disfunções renais.

403 visualizações0 comentário
bottom of page